Hoje na minha sessão de análise, discuti com a analista sobre a dificuldade de estar na posição de impotência, algo que acredito seja muito desconfortável para todos nós. O dicionário, define a impotência como a falta de poder, meios ou forças para realizar algo, incapacidade ou impossibilidade de realização. Na minha história, sempre lutei contra esse sentimento. Na infância passei por alguns problemas ocasionados por uma síndrome genética que alterou o tamanho de meu baço e fígado, trouxe uma baixa de plaquetas e a necessidade de muitos exames de observação. Felizmente, nada além disso. Mas o prognóstico em alguns momentos, foi bem desanimador. Hoje eu entendo que possivelmente , a manifestação da minha doença, foi  menos grave, o que pouco impactou a minha condição física.

E como eu reagi diante disso?

Psicologicamente, eu cresci acreditando que era capaz de mudar o mundo, pois havia vencido a doença. Ledo engano, eu sei, mas durante minha infância nas buscas pelo diagnóstico, era assim que eu me divertia acreditando que na minha onipotência. Com o passar do tempo, a vida se encarrega de colocar a gente no devido lugar: nossa capacidade é limitada. Mas a pergunta é: quanto? E assim, como alguém que se dedica a desenvolver pessoas e acreditar na capacidade de transformação e realização humana, pergunto:

Até onde vai nossa capacidade?

Para pensarmos nisso, escolhi como exemplo a trajetória de um dos maiores cientistas do nosso tempo: Stephen Hawking. É possível que a gente não compreenda exatamente sobre suas teorias, mas certamente nos lembramos de sua figura cativante. Hawking, como sabemos, era portador de uma doença degenerativa grave, progressiva e incurável, causa um comprometimento dos músculos voluntários. Mesmo assim, o cientista viveu por 76 anos, e é considerado alguém fora da curva. Ainda hoje, suas contribuições para a física e ciência, continuam sendo comprovadas. Mas como foi possível? Após uma rápida pesquisa sobre o assunto, a maioria das respostas considera que a progressão da doença, varia de acordo com o indivíduo e assim, não é possível determinar com certeza qual fator (es)  contribuiu (ram) para a supreendente  trajetória de Hawking.

Alá a impotência aí novamente.

Algumas condições, entretanto, podem ter contribuído para esse resultado. A genética, por exemplo, tem uma influência extremamente grande na gravidade da evolução da doença, assim como a idade precoce em que o cientista foi diagnosticado, podem ter contribuído para que a evolução, tenha sido menos agressiva, ou  impactante na  sua sobrevivência. Mas o que chama a atenção é que, Hawking não ” sobreviveu” a sua doença, ao contrário, ele teve uma vida realmente impressionante, cheia de realizações, alinhadas as suas crenças e propósitos. Casou, teve filhos, e era  mundialmente famoso pelo seu senso de humor. Um de seus posicionamentos, deixa muito claro a mentalidade que tinha no enfrentamento de suas condições clínicas, quando fala sobre sua vida com deficiência: ” Meu conselho para outras pessoas com deficiência seria concentrar-se em coisas que sua deficiência não impede que você faça bem e não se arrepender das coisas com as quais ela interfere. Não fique incapacitado tanto em espírito quanto em físico” Esse posicionamento com certeza contribuiu para que sua imensa capacidade analítica, inteligência e paixão pela ciência, tornaram-se sua potência para lidar com suas adversidades.

Mas e na prática?

Fica fácil compreender que sim, temos limites determinados muitas vezes por questões que fogem ao nosso controle e isso é compreendido como impotência. Da mesma forma, potência é a capacidade que temos de viabilizar algo, de influenciar positivamente os resultados a nosso favor, através de ações. Assim, o que temos que fazer é compreender exatamente o que está na nossa alçada e o que não está e focar naquilo que está, certo? Até aí tudo bem…  Mas o problema aqui aparece mais uma vez quando pensamos que muitas vezes esses limites não são bem delimitados. Ao contrário da física de Stephen Hawking, a vida não é uma ciência exata. Muitas vezes não temos clareza, por falta de conhecimento ou por falta de oportunidade, quais são todas as variáveis envolvidas em uma situação para determinarmos quais podemos influenciar.

Como resolver essa sinuca de bico?

Acredito que a resposta a essa pergunta pode ser encontrada em diferentes viéses, ao gosto de cada um. Podemos buscar uma resposta na religião, nas diferentes crenças, na filosofia, que procura compreender o homem na sua jornada ou na ciência, que ressalta a importância da pesquisa e na replicação de experiências para criar conhecimento. Pode ser que você leitor, leitora, que chegou até aqui, sinta-se decepcionado de não encontrar uma resposta para como lidar com a indefinição que nada mais é do que a impotência novamente.  E talvez pense: Por que raios eu fui ler esse texto? E eu me pergunto o mesmo: Por que será que resolvi escrever sobre isso? Mas nem tudo foi em vão:  acredito que se não há um caminho definido, isso não significa que não há caminho. Talvez a resposta esteja justamente aí, cada um de nós poderá escolher ser potência, mesmo quando não há definição. Exemplos para isso não faltam: escolhemos esse caminho tantas e tantas vezes, quando decidimos buscar um emprego, quando escolhemos iniciar um relacionamento ou terminar um outro, ou quando partimos em busca de algo que não sabemos ao certo, mas acreditamos que o melhor virá. Nossa potência, se manifesta no dia a dia, na vontade de fazer o possível, na crença de um amanhã promissor, na expectativa de deixar um legado, de construir algo útil, de fazer diferença para quem amamos. Assim, no meio das incertezas, colorimos a nossa existência construindo o caminho durante o caminhar e isso basta ou pelo menos deveria bastar.

E agora fica mais fácil?

Ter consciência da importância pode sim facilitar a compreensão de que nem sempre vamos ganhar todas, mas isso não significa que não sofreremos nas derrotas. O conhecimento não é um antídoto para o sofrimento, infelizmente. O sofrimento é inerente a termos vivido a potência das nossas realizações e perde-lás sempre é sofrido. Por outro lado, a potência surge da nossa consciência da falta, ou seja, é a impotência nos obriga a deixar nossa zona de conforto e ir em busca do que nos falta, e é somente por causa dela e através dela que conseguimos evoluir. Potência e impotência se misturam, da fraqueza se faz a força ou parafraseando Gassho: “ Caminha e o caminho se abrirá” Um abraço Leticia Rodrigues